Existe relação entre ética e política?
Aristóteles, filósofo grego antigo nascido em Estagira, na Macedônia, e viveu entre 384–322 a.C., explorou em sua obra a relação entre ética e política. Para ele, os seres humanos são naturalmente políticos, pois o indivíduo pertence à comunidade, e é nela que ele pode expressar sua natureza social, interagir com outros e participar de debates sobre questões de justiça e injustiça.
Mas até onde vai o limite entre o indivíduo e o coletivo? Até onde há relação entre os nossos propósitos e os objetivos da comunidade? Afinal, existe relação entre ética e política?
O homem é um animal político
O artigo “Aristotle’s Nicomachean Ethics and Politics” (“Ética e política a Nicômaco de Aristóteles”, em tradução livre) de Daniela Cammack, PhD em Ciência Política pela Harvard University, apresenta o conceito em que – para Aristóteles – os seres humanos são por natureza “animais políticos”, isto é, são naturalmente sociais, vivem juntos em comunidades mais ou menos auto-suficientes e têm como função alguma coisa única que todos eles fazem juntos.
Os humanos não são os únicos animais que vivem dessa forma. As abelhas, por exemplo, também possuem sua organização social. Porém, os seres humanos possuem o “logos”(a razão verbal ou linguagem, em grego) que os permite discutir entre si como organizar sua polis (cidade).
Cammack indica, portanto, que somente os humanos são capazes de apresentar “o conveniente e o inconveniente e, portanto, igualmente o justo e o injusto”.
Nas palavras de Cammarck, em tradução livre, cujo original pode ser lido aqui:
“o mundo social humano está aberto ao debate e ao desacordo. Para Aristóteles, o mundo é divisível em coisas que podem ser mudadas pelos humanos e coisas que não podem: o nosso mundo político cai na primeira categoria, por isso temos muitas opções sobre como fazer as coisas, mas como temos um objetivo específico em mente (isto é, concretizar a eudaimonia tanto nos indivíduos como na polis como um todo) existem formas melhores e piores de organizar a polis no que diz respeito a esse fim, e precisamos tanto de sabedoria prática (que é o resultado da experiência) e ciência política (na qual Aristóteles está trabalhando aqui) para descobrir a melhor forma de fazê-lo”. (Cammarck)
A natureza humana na busca pelo bem
Aristóteles acreditava que a virtude é fundamental tanto para o indivíduo quanto para a comunidade política. Ele identificou as virtudes morais e intelectuais como essenciais para a realização da eudaimonia, que representa a busca pela realização plena e pela excelência moral e intelectual, alcançada através da prática das virtudes e da participação na vida comunitária. Leia mais sobre a eudaimonia no texto “É possível ser feliz sem disciplina?”.
Em sua ética, Aristóteles entende as virtudes como hábitos adquiridos através da prática e da educação, e elas são cruciais para uma vida ética e para uma sociedade justa. Assim, Aristóteles não vê a política apenas como a organização do governo ou a administração dos assuntos públicos, mas como uma forma de vida compartilhada em que os seres humanos buscam a justiça, a virtude e a felicidade, e, nesse contexto existe a relação entre política e ética.
A relação entre política e ética
Para Aristóteles, a política, que representa a vida da cidade (polis em grego) e a ética, que é a busca por uma vida virtuosa individual, estão intrinsecamente ligadas. “A política que também é uma ciência prática não se dissocia da ética, elas apenas se diferenciam pelo fato de a primeira apresentar uma dimensão social, coletiva, enquanto a outra se restringe ao particular, individual” (AMARAL; SILVA; GOMES, 2012).
[…] razão, ética e política são elementos inseparáveis, constitutivos do homem em Aristóteles. Por um lado, a característica de ser racional o conduz à vida política. A vida política, por sua vez, norteará o bem viver ou o viver ético deste homem, que terá como expressão mais própria desta boa vida a própria vida racional. Conclui-se, assim, um círculo virtuoso que para existir não pode prescindir de nenhum destes três elementos que lhe são constitutivos (PANSARELLI, 2009).
Nesse contexto, tanto a política quanto a ética têm como objetivo alcançar o bem supremo, ou eudaimonia, que já falamos anteriormente e é frequentemente traduzido como felicidade ou realização plena. No entanto, Aristóteles não considerava a felicidade como mera satisfação pessoal, mas como a realização de um propósito maior, incluindo virtudes morais e atividades intelectuais.
Talvez esse pode ser um critério relevante para a análise política. Será que nossa inclinação é meramente ideológica ou temos – de fato – candidatos que caminham na busca do bem?
Referências
Veja o original das citações de AMARAL; SILVA; GOMES, 2012 e PANSARELLI, 2009 no texto “A Ética em Aristóteles”, por Alexsandro M. Medeiros.
📷 Jacob Simonsz de Rijk getting the Spanish Governor-General Requesens to Release | Marnix van Sint Aldegonde, 1575 (1805 – 1808) | Imagem reprodução