Como distinguir o sentimento da emoção?
Você já deve ter passado por situações que não conseguiu disfarçar a raiva, ou teve aquele friozinho na barriga diante de uma apresentação no trabalho, ou mesmo não se conteve de tristeza diante de uma notícia ruim, ainda que num ambiente formal.
Muitas vezes buscamos respostas para os nossos conflitos, mas não é incomum o uso de métodos ineficazes, que por vezes pioram o problema. É possível afirmar que uma das causas é justamente a nossa dificuldade em compreender a origem dos problemas e, por seguinte, buscar uma forma de solucioná-los.
Nesse cenário, proponho aqui uma breve reflexão sobre como distinguir o sentimento da emoção, os limites de uma resposta saudável do corpo diante das circunstâncias e os seus benefícios para a nossa vida.
Sentimento ou emoção?
Antônio Damásio, neurocientista português escritor do livro “O erro de Descartes”, distingue sentimento e emoção.
Para ele, a emoção é sempre biológica que herdamos dos nossos ancestrais de forma primitiva e que agem no nosso organismo. As emoções primárias, por exemplo o medo, a raiva, o nojo, a alegria, a tristeza, a surpresa, agem diretamente em nosso organismo, mudam nossa expressão facial, sentimos calafrios ou aquele “frio na barriga”, etc. Essas emoções não são boas ou ruins, mas um importante alerta do corpo. A amígdala cerebral que age em nosso corpo como um gatilho das emoções. Por exemplo, se você vê uma aranha e você tem medo de aracnídeos, de forma automática dispara a emoção do medo e você cria um mecanismo de defesa para lidar com a situação. O corpo reage.
Por sua vez, o sentimento é a reflexão sobre a emoção e ocorre a partir das situações externas que podem desencadear uma emoção. Por exemplo, quando temos medo de falar em público, de visitar pela primeira vez um lugar desconhecido ou mesmo que determinado projeto possa não ter o sucesso esperado. Esses são, inclusive, causas de ansiedade e depressão.
O controle da emoção
Quando a amígdala cerebral entra em ação e dispara em nosso corpo a emoção, o natural é entrarmos em um estado de repouso, pois – de certo modo – internalizamos a circunstância que preconiza a emoção. Porém, quando a amígdala cerebral dispara as emoções de forma constante e desequilibrada, gera um problema no indivíduo de natureza psíquica que pode gerar trauma e um constante estado de alerta que pode ser prejudicial.
Na psicanálise de Freud, a neurose é um estado saudável e normal para o ser humano. Todos somos neuróticos de alguma forma. Para os psicanalistas Jacques Lacan, francês, e para o psicanalista brasileiro Ivan Capelatto, a neurose tem as três emoções básicas – medo, raiva e culpa – sendo trabalhadas de forma saudável.
Para Lacan, sentir medo é importante, pois é ele que me protege de perigos maiores, por exemplo, é o medo que me impede de pular de um prédio ou visitar lugares onde me sinto ameaçado.
Na psicanálise, o oposto de uma neurose saudável é a perversão, ou seja, não sentir medo, raiva e culpa. Nesse sentido, Capelatto orienta sobre a possibilidade do indivíduo tornar-se inconsequente, algo comum durante a adolescência, mas que sem o controle ou levado à vida adulta, pode causar problemas pessoais e para a sociedade.
Não se sinta culpado
Ao buscar esse texto, é possível que você venha de um sentimento de culpa ou se sentindo mal pela reação indesejada diante de circunstâncias da vida. Não se sinta culpado, é normal. Vimos que algumas reações que temos, sobretudo acerca das emoções primárias, são formas do corpo se proteger e voltar ao repouso. Do mesmo modo, observe-se para compreender quando e como e, principalmente, a frequência com que essas reações ocorrem. O estado de alerta frequente ou a neurose desequilibrada podem ser prejudiciais. Se necessário, procure um especialista.
Referências
CAPELATTO I. O amor na era da sobrecarga. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=SdAY0_muRx4> acesso em 21 de maio de 2023.
📷 Der Brief (1851) | Johann Georg Meyer von Bremen (German, 1813–1886) | Imagem reprodução