Superando a angústia e a ansiedade
Hoje eu quero compartilhar uma experiência pessoal que me ensinou muito sobre como lidar com a angústia e a ansiedade.
Em meados de 2003, eu era seminarista e estava no último ano da faculdade de Filosofia. Após praticamente 5 anos no seminário estava num momento muito produtivo mas psicologicamente demandava muito. Rotina pesada e autocobrança. Lembro como se fosse hoje, em maio daquele ano, numa terça pela manhã, atrasado, saí sozinho correndo para a faculdade, quando de repente tive um “piripaque”, apaguei no meio da rua. Minha “sorte” é que foi em frente a padaria que fornecia os pães para o seminário (por que será?). Fui acudido e após 10 minutos melhorei e continuei meu caminho.
A partir daquela experiência, interrogações gigantes passaram a pairar sobre a minha cabeça – “Será que tenho problema de coração?” Será que vou morrer?” Aquilo foi crescendo e crescendo, me angustiando, ao ponto que quando ficava sozinho a ansiedade tomava conta e as palpitações cardíacas apareciam, de modo que a sensação de morte era eminente. Aquele quadro passou a ser insuportável.
Naquele mesmo ano, aproveitei as férias para fazer um “check up”, apesar de somente ter 18 anos. Pedi para fazer tudo, e os resultados dos exames confirmaram, que não havia alterações físicas. Fiquei mais tranquilo, mas pensei: “caramba, agora só depende de mim.”
Através da autorreflexão e terapia pude mergulhar no problema e entender melhor as suas raízes. A partir do entendimento do problema, também foi possível estabelecer estratégias para lidar com e superar, descritas nos passos seguintes:
Aceitar a realidade do problema: não era frescura ou fraqueza. Poder falar sobre e elaborar me permitiu reconhecer e delimitar o problema.
Objetivar o problema: já havia realizado o “checkup” e racionalmente sabia que era improvável morrer disso. É o movimento de assumir a situação e se colocar acima do problema para examiná-lo.
Agir: estabelecer ações de enfrentamento – não dá para se esquivar – literalmente enfrentar o medo que restou daquela primeira situação de “piripaque” – sabendo que o máximo que poderia acontecer era ter outro, e tudo bem – Aqui Viktor Frankl, criador da “Logoterapia”, nos sugere ser muito útil propormos o fato que gera medo a nós mesmos, como por exemplo no meu caso: “vou sair na rua agora e imediatamente vou ter um treco, vai acontecer”. Ou, ainda, “eu não vou conseguir, estou ficando ansioso e vou travar agora mesmo.” Por incrível que pareça, funciona.
Superar o problema: permitir a rir da situação – quando conseguirmos rir de nós mesmos, significa que ficamos em paz em relação há aquele aspecto.
“A ansiedade neurótica é sinal de um conflito não resolvido e enquanto este existir há uma possibilidade de tomarmos consciência das causas desse conflito e encontrarmos uma solução em plano mais elevado e saudável.” Rollo May
A angústia e ansiedade são naturais, o que não é natural quando se tornam crônicas e desproporcionais à realidade. Kierkegaard postula que a culpa é decorrente do pecado, sendo este a principal raiz da angústia. Na prática, são as ações que ameaçam a nossa existência – por exemplo: os excessos, comida, drogas, bebida, fumo, falta de exercícios, misturado com não aceitação interior e o sentimento de culpa por estar em desarmonia com aquilo que estabelecemos como “eu ideal”. Esta dinâmica gera conflito interior, que cria pressão e se mostra através da angústia e ansiedade – sofrimento.
Para terminar, as vezes parece chato, mas esta história nos ensina que o autoconhecimento é fundamental, pois é o que vai nos permitir fazer escolhas mais assertivas que resultam numa qualidade de vida de maior. As nossas angústias e ansiedades em última análise demandam de nós sentido e congruência: nossas ações estarem em harmonia com o nosso ideal – ser quem se é, para chegar a ser quem se gostaria de ser.
Referências
📷 Peasant woman threading a needle (1861) | Jules Breton (French, 1827-1906) | Imagem reprodução