Como viver o luto e superar a saudade?
No período em que se celebra o feriado de finados, que para muitos torna-se um dia de dor e sofrimento, gostaria de convidá-lo a fazer um percurso diferente, e proponho este itinerário a partir do Apocalipse de São João, que diz que onde há esperança de algo além de toda dor e de toda morte, há uma mão que “enxugará toda lágrima de seus olhos e já não haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição”.
Ninguém escapa do luto e de acompanhar outros em suas perdas, desta forma é um desafio para todos. Mas a morte e o luto podem tornar uma experiência humanizante, e não apenas uma experiência de vazio e perda. A morte alheia pode nos humanizar, pois nos tira da zona de conforto, e pode nos ensinar.
Quem já viveu o luto e a perda sabe do vazio que fica e dos constantes momentos de saudade, mas quem aprende a viver próximo de pessoas que estão em o luto como um ato de doação, desenvolve a capacidade de tornar-se mais generoso, compassivo e acolhedor, pois passa a entender a dor do outro diante de tantas realidades da vida.
O sofrimento e a dor
O poeta Rainer Maria Rilke, em seu livro “O livro da pobreza e da morte”, sinaliza que muitos de nós não sabemos morrer. De fato, quando não compreendemos a morte, cada perda torna-se um luto interminável e uma dor que não cicatriza. Neste sentido, a crença em algo nos possibilita melhor viver a perda.
Ao acreditar em uma vida além desta que nos é oferecida, esta vida se torna uma estrada a ser vencida e superada. E como toda estrada, ela tem desafios e percalços, tornando o luto maduro nos torna mais forte e resiliente. Diante desta realidade surge um grande desafio. Vivemos em uma sociedade onde se desenvolve uma linha de pensamento perigosa, que é a negação do sofrimento e da dor. Sejamos realistas: não existe esta possibilidade.
Uma vida sem dor e sofrimento é uma utopia intelectual como tentativa de imprimir um pensamento coletivo em torno da negação da verdade. Negar todo sofrimento é negar uma existência real, negar a dor é recusar a possibilidade de superação e de alcançar a felicidade.
Digo isso porque qualquer pessoa diante da perda e da dor que não toma a atitude de superação, e reafirmo superá-la e não esquecê-la, corre sério risco de viver em um mundo egoísta onde somente suas dores são reais e profundas enquanto a de outros são meras fantasias.
Viver a saudade com maturidade
A saudade é um sentimento presente que nos permite a não esquecer coisas boas em nossa vida, portanto no luto a saudade vivida de forma madura torna a presença daquele que se ama perpétua, e nos impede de ficar buscando o objeto do nosso amor em realidades utópicas.
Mas como posso viver isso?
Nas coisas simples como guardar uma caneca preferida, sentar na cadeira que ela mais gostava, manter o cantinho predileto, ou usar palavras de seu cotidiano, são realidades que se tornam sacramentais em nossas vidas. São realidades simples que não conduzem a negação da dor, mas a superação do sentimento de perda.
A superação de todo luto ou perda se dá com a vida, vida a ser vivida e desejada como diz o santo Tomás de Aquino: “Nenhum homem possui verdadeiramente a alegria a menos que ele viva apaixonado”.
Referências
📷 Never Morning Wore To Evening But Some Heart Did Break (1894) | Walter Langley (English, 1852 – 1922)