Como lidar com o sentimento de angústia?
Toda vez que chega aos nossos ouvidos a palavra “angústia”, logo nos vem à mente uma sensação de crise ou de desorientação. Estar angustiado parece ser algo de outro mundo, ou melhor, que nos remete a outro mundo, sentir-se fora de si mesmo, “perder o chão”.
Esse sentimento quase sempre vem associado ao medo e ao sofrimento. Por isso, a angústia é um sentimento para se fugir, ou ao menos, se esquivar. De qualquer modo, essa sensação de, “não sei quê”, nos tira o sossego e nos desorienta. Então, buscamos fugir dele, pois ninguém quer sentir-se angustiado.
Mas, o que o filósofo dinamarquês Sören Kierkegaard tem a nos dizer sobre isso? Exatamente o contrário. Para Kierkegaard, a angústia não é algo para ser evitado, mas vivido. Ele escreveu em 1844 uma obra intitulada: O Conceito de Angústia, no qual aborda detalhadamente a questão.
Se para nós a angústia é um sentimento a ser evitado, para Kierkegaard é para ser enfrentado, pois ela não aparece em mim, mas existe desde o meu nascimento. Nós somos “angústia”. Ela é dada a nós para ser vivenciada, primeiramente, em estado de inocência, ou seja, sem termos conhecimento sobre ela, ou sobre o seu significado.
O exemplo típico disso são os primeiros anos de nossa infância: a criança só deseja se divertir, brincar, buscando seu próprio prazer. Ela não conhece ou não distingue o certo do errado, o bem do mal. Desse modo, não se angustia quando algo dá errado. Neste estado de inocência ela terá apenas o conhecimento de sua existência.
Para Kierkegaard, é dessa inocência que aparece a relação com o nada. Mas que efeito tem o nada em nossa vida? Para o filósofo é daí que aparece a angústia, ou seja, ela me coloca diante das possibilidades da vida que me fazem querer muitas coisas. Mas, como não posso possuir tudo, então preciso escolher.
O que eu quero da minha vida? O que desejo para mim? É possível querer e desejar qualquer coisa, porém, não possuir tudo. Diante da possibilidade, sou livre, mas como não posso abarcar tudo, preciso escolher, e aqui está a angústia.
Ela aparece, para Kierkegaard, num sentimento que nos impulsiona diretamente a uma ação, ou seja, a angústia nos exige consultar a nós mesmos e assim decidirmos por nossa própria conta o que vamos fazer. Em outras palavras, a angústia nos torna responsáveis pelas nossas decisões.
Para Kierkegaard, isso não é negativo, visto que não se trata de um sentimento de dor e sofrimento, mas algo positivo. Ela me coloca diante do meu existir e me faz decidir. É por meio da angústia que eu decido qual caminho seguir. A pessoa angustiada, para o filósofo, é aquela que sabe o que quer da vida, pois decidiu ser ela mesma diante das possibilidades que a vida apresenta.
A angústia, portanto, está relacionada com a liberdade da pessoa: coloca-nos livre para decidir na vida. E como decidir é escolher, isso angustia. Contudo, sem ela eu não decido, não escolho, eu me paraliso; e uma pessoa paralisada não possui uma vida autêntica, isto é, não é ela mesma.
Referências
📷 Le Livre De Prix (1901) | William Bouguereau (French, 1825-1905)