Calibrando o desconfiômetro

16 de novembro de 2020

“O problema do mundo de hoje é que as pessoas inteligentes estão cheias de dúvidas, e as pessoas idiotas estão cheias de certezas…” Bertrand Russell

É de impressionar como as redes sociais se tornaram verdadeiros campos de batalha onde as armas são uma mistura de preconceito e raso nível de conhecimento. A intolerância e o “politicamente correto” dão a tônica do discurso. Pessoas com o dedo no teclado para disparar ataques e críticas destrutivas a quem quer que manifeste algo diferente de suas crenças. Outros, os patrulheiros de plantão para apontar qualquer ação que não está de acordo com o politicamente aceitável. Como se tivessem apenas dois lados da moeda da vida, eu ou eles, nós ou eles. Me pergunto se estes mesmos seriam tão rápidos e motivados se precisarem sentar-se, aprofundar e discutir ideias em uma mesa redonda.

“O espetáculo do mundo nos oferece frequentemente cenas de violência e intolerância, nascidas de preconceitos que querem se impor pela força, na ausência de questionamentos e, sobretudo, do exercício da razão.” René Descartes

Entendemos que fincar posição e ter certeza de tudo, mais sugere fragilidade, insegurança e falta de conhecimento das reais motivações de suas posições. Aquelas famosas frases: “Só é bom se for assim”. “Eu já tentei outras maneiras, mas o único jeito de fazer aquilo é este.” Será? O “só sei que nada sei” de Sócrates cabe como uma luva aqui, porque quanto mais nós ampliamos nossos conhecimentos, mais teremos consciência do quão pouco sabemos diante da imensidão do universo. É mais ou menos a dinâmica de se olhar uma imagem da terra tirada do espaço, isso exemplifica bem a nossa pequenez no universo.

Qual a diferenças entre criticar e discutir ideias?

A crítica é um julgamento do outro, com base na experiência, crença e necessidade do julgador. Típico de pessoas que são rasas, porque acreditam que a sua própria realidade pode ser generalizada para toda a humanidade e não se comprometem a entender o contexto do outro.

Na discussão de ideias, as duas partes se comprometem uma com a outra. O comprometimento mútuo gera responsabilidade e também construção mútua. Se busca compreender os fundamentos da ação ou posição da outra pessoa para a partir daí trabalhar argumentos e possibilidades com base em suas necessidades e individualidade, de maneira respeitosa e elegante.

Meu caro amigo, não dá para mudar a crença de alguém, pretensão do ingênuo ou do mal caráter. As nossas crenças são formadas no decorrer da nossa vida, a maior parte na infância e adolescência, portanto, bastante enraizadas.

Atacar a visão do outro sem entendê-la não contribui para o processo de mudança e desenvolvimento, ao contrário, fará com que o outro entre em modo de defesa e se fechar – mais ou menos como os portões de um castelo que são fechados, quando sob ataque. Por outro lado, ser empático, perguntar mais do que falar e entender as bases, sim, poderá abrir as portas para o entendimento e mudança.

Qual dos dois tipos de pessoas queremos ser?

Se temos muitas convicções e pouco conteúdo, talvez seja o momento de virar o jogo e adquirir o hábito de estudar, meditar e se aprofundar nos “porquês”, ou seja, nos fundamentos de nossas crenças. Segundo o filósofo alemão Hegel, “a educação é a arte de tornar o homem ético.” Calibrar o desconfiômetro é isto, quando o nosso dedo apontado para o outro, começa a primeiro se virar para nós mesmos.

Referências

📷 The Curious Little Girl (1860–64) | Jean-Baptiste-Camille Corot (French, 1796 – 1875)