O insaciável desejo de saciar-se
Já parou para pensar nos seus pensamentos? Já percebeu a lista de coisas que provavelmente passam na sua (e na minha) cabeça como prioridades máximas? Precisa de um carro? Trocar de smartphone? uma reforma em casa? Uma festa de aniversário? E aquela chuteira para o futebol com os amigos?
Mais uma provocação. Seja sincero: já aconteceu de desanimar da última compra antes mesmo de usá-la?
O filósofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860) dizia que a vontade é o único elemento permanente e imutável na mente e é insaciável, portanto, é conflito e dor. Nesse contexto, a essência do homem é um querer constante em uma sede inextinguível. Sendo a vida uma necessidade e dor, a medida em que esta é satisfeita, cai-se no tédio, no vazio.
Na prática, a teoria de Schopenhauer nos ensina que o ser humano vive em um insuportável ciclo contínuo de “quero (vontade) – tenho (tédio) – quero (vontade)…”. Explico.
Suponha que você (ou eu) quer muito uma televisão. Ora, você deseja, cria argumentos, pesquisa, não consegue tirar a TV do seu pensamento, pois é impossível imaginar que está perdendo aquela série favorita pela sua TV atual não ser Smart; ou mesmo sem perceber detalhes já que sua TV não é 4k. Enfim, é um objeto de desejo. Chega então o grande dia que após muitas pesquisas e cálculos, você (ou eu) compra o televisor. Ora, um breve sentimento de fascínio e ao chegar do produto, uma ansiedade para instalá-lo e começar a assistir. Até perceber que seu pacote de canais não é HD. E você imediatamente ignora a alegria e/ou satisfação da TV nova (pois você agora já a tem) para uma nova insatisfação, que é uma grade de canais por assinatura de melhor qualidade. Dessa forma, toda aquela ansiedade, cálculo financeiro, pesquisa de operadoras, etc. se reinicia. E após contratar os canais, vai precisar de um sofá novo, que será seguido de um novo rack e assim sucessivamente.
Então, para Schopenhauer a vida é uma oscilação entre dor e tédio e, pelo exemplo acima, me parece que ele não está tão errado assim, concorda?
Isso foi uma conclusão que ele chegou a partir de seu contexto social nos séculos XVIII e XIX. Ouso dizer que atualmente, essa dinâmica é potencializada pelos meios de comunicação. Imagina se na época de Schopenhauer existisse internet e suas múltiplas possibilidades?
Pense comigo. Somos inundados por uma avalanche de produtos e serviços que prometem tornar a nossa vida mais feliz. Será? Que tal quebrar o ciclo?
Referências
REALLE, G.; ANTISERI, D..História da Filosofia: do romantismo até nossos dias. 6 ed. São Paulo: Paulus, 2003. vol. 3
SCHOPENHAUER, A. Dores do Mundo. Tradução: José Souza de Oliveira. 4. ed. São Paulo: Brasil Editora, 1960.
SCHOPENHAUER, A. O Mundo como Vontade e Representação. Tradução: M. F. Sá Correia. Rio de Janeiro: Contraponto, 2001.
📷 A Vegetable Seller At The Groenmarkt, The Hague | Petrus van Schendel (Dutch, 1806-1870) | Imagem reprodução